quinta-feira, 5 de maio de 2011

Se Meu Opala Falasse

Comprou um Opala 1978. A lataria estava impecável, já a mecânica nem tanto. Fizera uma boa compra e, portanto, havia guardado algum dinheiro a mais. Resolveu mudar a suspensão, retificar e turbinar o motor, colocar freio a disco nas quatro rodas, trocou as pedaleiras e comprou os melhores pneus aro 18. Escolheu a roda a dedo, e com alguns meses de trabalho a charanga estava pronta. Saia pela cidade à noite com os faróis apagados e as janelas abertas na maior velocidade que conseguia controlar o carro sob a luz da Lua. Era como um cavalo arredio que guardava um ímpeto selvagem. Aquilo lhe propiciava uma satisfação incomensurável e o vento que entrava pela janela tinha o sublime gosto da liberdade. Decidiu apimentá-lo com nitroglicerina e satisfazer ainda mais seu ego e anseios. O combustível do mundo não seria suficiente para aqueles canecos vorazes, contanto que algo parasse o homem ou a máquina. O destino lhe sorriu dizendo que sua hora não havia chegado, mas a ordem não o perdoou e o peso da mão de ferro arrefeceu a libertinagem. A coerção abocanhou-o pela jugular. Havia aprendido que esse desejo selvagem e passional de viver um pouco da liberdade não passava de uma tolice juvenil que não seria tolerada. O belo ronco do motor silenciava no pátio da polícia ante o eco vazio do modus vivendi, e a tolice não se revelaria fugaz o suficiente para deixar de corroê-lo por dentro.